O drama do sonho que vira pesadelo

O drama do sonho que vira pesadelo




Se fosse um livro, a história dos milhares de brasileiros que deixam o país sempre teria em comum as páginas iniciais. O sonho de adquirir uma vida melhor para si e a família deu asas para que todos eles voassem rumo ao desconhecido.

Essa idéia de uma vida melhor no exterior é recente, iniciando-se apenas na década de 70. Estima-se que mais de 100 mil brasileiros emigram todos os anos para outros países, destes, 300 mil são goianos que já moram e 70%, (210 mil) estão em situação irregular.

O anapolino Bruno Lemes de Sousa, de 28 anos, fazia parte desta estimativa. Saiu do Brasil rumo à Irlanda, com a promessa de mudar de vida, já que seria suspeito de participar do homicídio de uma mulher, além de dar uma condição monetária melhor aos pais e à filha de três anos.

No condado de Kerry, ele trabalhava como operário de uma fábrica local e nas horas vagas comprava e vendia carros para engrossar a renda. Para a família, ele se dizia muito feliz com a vida e a namorada brasileira, sempre falava em voltar, mas primeiro precisava ganhar mais dinheiro e garantir a estabilidade.

No dia 16 de fevereiro, Bruno ligou para a companheira avisando que levaria o carro para um cliente em outra cidade, mas chegaria a tempo do jantar. Não foi o que aconteceu. A partir deste dia, começou a jornada de angústia por notícias do jovem, e possíveis pistas para encontrá-lo.

Somente no último domingo (11), após 24 dias de buscas, a família e amigos foram informados que o corpo de Bruno fora encontrado em um pântano há 150 km da cidade onde morava, com sinais de violência.

Dois homens, um brasileiro e um irlandês são suspeitos do crime, que possui várias especulações. Um conhecido afirma que a vítima devia mais de € 9 mil, a ciganos; o jornalista Owen Conlon, porém, ressalta que a polícia local acredita que os suspeitos mataram Bruno, pois, este vinha flertando com a namorada de um deles.

Independente das razões que motivaram o crime fica uma família desolada que não terá direito de velar e se despedir do ente que foi em busca de um sonho e voltará em forma de cinzas, já que o translado do corpo em decomposição é inviável tanto de forma logística, como monetária.

Conheça a história de brasileiros que saíram pelo mundo, assim como Bruno, em busca de uma vida melhor e nem sempre essa foi a realidade encontrada.

A vida dele é um filme

Parece história de filme, mas não é, o anapolino Roger (nome fictício), deixou a mulher e a filha em Anápolis, com a promessa de um bom emprego na Bélgica. Ao chegar no país, a realidade era diferente: acomodações precárias, insalubridade laboral e um salário tão mirrado, que os vencimentos só davam para pagar as despesas básicas e enviar uma quantia à família.

A situação de Roger se complicou, quando ele perdeu o emprego. Como ele não conseguia economizar, se viu abandonado pelos amigos que o convidaram para morar no exterior, e obrigado a morar no metrô como um indigente.

Com aparência desfigurada, barba gigante e banho como uma raridade, ele conseguiu a compaixão de uma brasileira, que vivia da prostituição. Ela conseguiu com um conhecido, uma audiência para Roger, com o rei belga, que lhe ofereceu uma passagem de volta ao Brasil, na condição de deportado.

Roger aceitou com prazer a deportação e voltou a Anápolis, local de onde ele diz nunca mais querer sair.

27 dias de trabalho sem folga

Fabiana é descendente de japoneses e tem uma irmã que já morava no país de origem. Ao ver o marido, José, desempregado, a necessidade de ter a casa própria e a vontade de dar uma condição melhor à filha de dois anos, não titubeou em procurar uma agência que fornece empregos a brasileiros no Japão.

Na cidade Joso-shi, província Ibaraki-ken, Fabiana trabalhou junto com o marido, em uma fábrica de alimentos congelados, e levavam uma vida que ela categoriza como difícil e ruim.

No Japão, a carga horária é similar à do Brasil, de oito horas diárias e se ganha por hora, porém era raro uma jornada inferior a 12 horas, já que quanto mais se trabalha, mais se ganha. Fabiana, conta que por ser mãe, ela tinha direito ao domingo de folga, mas, o marido era obrigado a comparecer no trabalho inclusive nesses dias. “O Zé, por ser homem, não tinha direito às folgas no domingo, ele já chegou a trabalhar 27 dias direto, sem nenhuma de folga”, destaca.

Fabiana, disse que sentia falta da espiritualidade típica do Brasil, pois, os japoneses são frios e se sentem ameaçados com a presença de brasileiros, que em tempo de crise, por serem mais ágeis e produtivos, acabam faturando as vagas nas empresas. Como consequência dessa vida agitada, ela disse que ao longo dos três anos de vida no Japão, presenciou muitas mortes por enfarto, que as pessoas não tinham tempo para desfrutar das aquisições e para os religiosos como ela, havia missa a cada dois meses e em locais muito distantes.

O Tsunami foi um fator inesperado na vida do casal. “Ficamos preocupados principalmente por causa da nossa filha. Quando soubemos do risco de contaminação era muito maior nas crianças tomamos essa difícil dicisão, pois, ainda não estávamos planejando voltar, ainda tínhamos dívidas pra pagar, tínhamos acabado de comprar a casa, íamos começar a comprar os móveis. Viemos na fé, crendo que Deus proveria tudo”, relata.

Mesmo com a conquista da casa e de outros bens, Fabiana garante que não pensa em voltar ao Japão. De acordo com ela, existem valores que nenhum dinheiro compra. “Apesar de precisar ainda, porquê ainda estamos tentando nos estabilizar financeiramente, não quero voltar, pois, com tudo isso, vimos que o dinheiro não é prioridade na nossa vida e que lá não tínhamos tempo pra família, pra nossa filha. Não queremos que a creche crie a nossa filha, nós queremos criá-la e conduzí-la no caminho de Deus, coisa que lá não tem como. Dinheiro a gente se vira, aprende a viver com o que tem”, declara.

Em busca do American Lifestyle

A década de 90 registrou um índice elevado de brasileiros que foram tentar a vida nos Estados Unidos (EUA), e dentre eles estava Zenaido.

Em 1995, ele conseguiu um visto de turista, deixou a profissão de ourives e passou seis meses no país do Tio Sam, para ver como era antes de mudar-se definitivamente com a mulher e os filhos.

Depois da experiência inicial, ele voltou ao Brasil, montou uma oficina mecânica e por algum tempo desistiu da idéia de voltar. Mas um divórcio mudou o rumo dessa história e dessa vez Zenaido mergulhou definitivamente no sonho americano.

Como o visto era de turista, logo seis meses depois houve o cancelamento da permissão de estadia nos EUA, e como milhares de brasileiros, ele permaneceu ilegalmente por muito tempo. Começou um trabalho de “chapa”, em construção de casas de madeira, mas hoje já é dono de uma construtora e possui vários funcionários.

Durante esses quase 10 anos de espera pelo Greencard (visto para imigrantes), Zenaido se privou da convivência com os dois filhos, que só falava por telefone, carta e mais recentemente, via webcam. O filho do brasileiro, Tony, diz que mesmo com a ausência do pai, a vida que ele lhe proporcionou compensou a falta. “Foi um tiro no escuro, mas com isso, ele comprou varios imoveis aqui, a casa dele lá, carros, está pagando minha faculdade, eu creio eu que se ele nao tivesse feio isso, tudo que temos hoje seria bem menos, e olha lá se teríamos algo. Ele nao acompanhou nosso crescimento, nem nos convivemos com ele nossa infância, mas com tempo acabamos acostumando”, explica.

Zenaido, recentemente levou o filho mais novo para morar com ele e não pensa em voltar ao Brasil, embora com a conquista do greencard, passe as férias anuais aqui.

A Crise mudou a rotina da brasileña

Encontrei Maria, minha chará, em uma mercearia de um bairro da classe média alta, em Madri, durante uma viagem no ano passado.

Assim que descobriu que eu e meus amigos éramos brasileiros, se alegrou e prontamente veio conversar conosco, logo descobrimos que ela morava no mesmo prédio onde nos hospedamos.

A princípio fiquei constrangida em perguntar qual era a sua ocupação, mas antes que eu questionasse, ela parece ter adivinhado minha curiosidade e contou que morava com o marido no residencial para cuidar de um idoso, já debilitado e era babá da filha da vizinha.

Ela contou que o filho e outros cinco imigrantes, dividiam o aluguel de um apartamento próximo, pois só desta forma conseguiam juntar algum dinheiro para voltar ao Brasil e que a maioria dos espanhois não têm afinidade com brasileiros, pois muitos apresentam condutas inaceitáveis, como prostituição, furto, uso de drogas e outras infrações.

Com a crise, a “brasileña”, como é conhecida Maria, ressaltou que a situação dos imigrantes ficou muito difícil. “Antes se houvesse força de vontade, dava pra fazer muita fachina e os homens encontravam muito trabalho braçal, mas agora, com essa crise, não tem emprego nenhum, principalmente os homens”, ressalta.

O marido da cuidadora de idosos, já estava com a passagem comprada e voltaria ao Brasil em janeiro, já ela, ainda demoraria um pouco mais, porém, também desejava retornar, pois disse sentir muita falta da filha, dos netos e da vida que levava.



Por fim ela me abraçou, e disse que esperava o nosso grupo para servir-nos arroz e feijão. Infelizmente, não pudemos visitar a Maria, mas sempe lembramos da alegria de seu jeitinho brasileiro.



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