Eu queria mudar; a balela do discurso





Eu queria mudar, eu queria mudar, eu queria mudar, eu queria mudar...Passei infância no Caje aprontei pra carai, na fulga da lotéria a casa sempre cai, se acostumar com as torturas é sempre difícil. Trabalho exige muito, roubar é meu vício.” (Pacificadores)

A banda brasiliense que incrivelmente se nomeia “Pacificadores” denota a característica visível do menor delinqüente no Brasil. Alguém que diz querer mudar, mas foge da escola, tem preguiça de trabalhar, mata gatos a pedrada, persegue os rivais de outra gangue e desde cedo comete delitos com muito orgulho, possui um caráter apreciativo do crime e utiliza do discurso social para fundamentar sua falta de reais interesses para “mudar” sua realidade.

Somos hipócritas. A educação deve mudar? Sim. É claro! Mas não fazemos nada por isso, apenas nos sentamos em nossas confortáveis poltronas, enquanto assistimos nossa programação televisiva e criticamos o governo. Assim é muito fácil. O menor infrator deve obter qualidade educativa, porém, que o governo se encarregue disso, nós continuaremos aqui em nossos devidos lugares. Este é nosso discurso omissivo.

Maior omissão que apenas cobrar ações governamentais é não aceitar a redução da maioridade penal. A legislação afirma em seu código que os menores de 18 anos não possuem desenvolvimento mental completo para compreender o caráter ilícito de seus atos. O “pacificador” da música revela a insensatez da constituição vigente no Brasil.

A leviandade de se corromper a integridade de outro cidadão é injustificável, seja por um fator social ou pela pseudo-imaturidade prevista pela lei. Um adolescente que comete requintes de crueldade deve ter ao menos um raio de iluminação em sua grande “imaturidade” para compreender que arrastar crianças pelo asfalto, atear fogo a moradores de rua, violentar moças, assaltar lotéricas, torturar oponentes, seqüestrar jovens, traficar drogas e outros atos como estes possuem caráter criminal.

Há os defensores da idéia de que se menores forem jogados à realidade lúgubre da cadeia serão submetidos a uma escola de desumanidade e contato com o crime. Eles não deixam de possuir veracidade em seu discurso, porém, se esquecem que a grande maioria dos infratores mirins já tem contato com essa escola há muito tempo e são educados por ela para agirem livremente na sociedade por fora das grades.

A ressocialização completa destes indivíduos vem da própria reconfiguração do sistema carcerário brasileiro. A construção de presídios destinados exclusivamente aos adolescentes infratores, que lhes condicione cumprir por seus atos de forma justa, proporcionando-lhes atividades educativas, acompanhamento psicológico, médico e dando-lhes a perspectiva que fora das grades não encontrarão. A educação que a sociedade e o governo se negam a dar de maneira livre a estes menores pode ser compensada tardia e radicalmente, atrás das celas de proteção da própria sociedade.

Talvez, seja mais fácil continuar comentando passivamente os acontecimentos, mas, se não quisermos participar dos próximos números da violência impune do país é preciso reverter alguns atos. Ser voluntário em projetos educacionais destinados a menores em situação de risco é um investimento mais barato e humanizado. O anseio de mudar não pode se restringir a uma música horrorosa de indivíduos fracassados e frustrados. É preciso mudar.

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